19.11.21

O racismo habita em mim? Artigo da educadora Camila Portugal sugere reflexão sobre o tema

Coordenadora do Comitê para Educação Étnico-Racial do Vieira destaca ainda documentos que fundamentam ações adotadas

O racismo habita em mim? Artigo da educadora Camila Portugal sugere reflexão sobre o tema

O racismo habita em mim? Percepções sobre o racismo, para uma educação antirracista


Por Camila Portugal, orientadora educacional e coordenadora do Comitê para Educação Étnico-Racial e de Gênero do Colégio Antônio Vieira

Pensar em reformulação de currículos, numa perspectiva étnico-racial, pressupõe também a reelaboração da cultura escolar e das suas práticas cotidianas, pois não se trata somente de modificar as atividades escolares, mas envolver toda a comunidade em uma mentalidade de respeito e legitimação dos conhecimentos e das contribuições de todos os povos que se encontram nos espaços de aprendizagem. Os documentos da Companhia de Jesus preconizam, de maneira explícita, essa necessidade. É o que diz, por exemplo, o Projeto Educativo Comum (PEC), da Rede Jesuíta de Educação (RJE), ao ressaltar que o desafio de articular fé e justiça nos leva a considerar, no espaço escolar, os temas referentes às questões étnico-raciais, “elementos referentes às culturas indígena, africana e afro-brasileira no Brasil e todos os temas similares relacionados a categorias ou grupos sociais que sofrem discriminação, violência e injustiça”.

Ora, se é sabido da necessidade de pensarmos em uma educação antirracista, com metodologias que garantam a representatividade de todos os estudantes, como preconizado nos documentos da Companhia de Jesus, bem como na Lei 10.639/2003, por que é ainda algo tão incomum nas instituições de ensino de modo geral? A resposta pode estar na dificuldade de reconhecer o racismo como algo estruturante da identidade do povo brasileiro. Portanto, faz-se necessário, principalmente, que as pessoas não negras reflitam sobre a possibilidade de que o racismo existe.

Implicar-se com o reconhecimento e o entendimento sobre o conceito mais amplo de racismo, e o quão estruturante ele é na nossa sociedade, pode ajudar na elaboração de soluções, por exemplo, para o problema da invisibilidade das pessoas negras e das suas produções e contribuições. Portanto, ​no caso dos colégios jesuítas, assim como o Colégio Antônio Vieira, a construção de projetos específicos, que contemplem as pautas que emergem dos estudos e das práticas em torno da temática educação étnico-racial,  deve estar em consonância com os projetos político-pedagógicos, com os documentos da Companhia de Jesus, além da Lei 10.639/2003.

Portanto, faz-se necessário, assim, que esteja em diálogo dinâmico e vívido com as questões da educação na atualidade, com os seus sujeitos, dentro de uma sociedade global, cujos fenômenos reverberam, cada vez mais, em nossos colégios.  

Painel em homenagem à escritora negra Carolina Maria de Jesus instalado na Biblioteca do Vieirinha.   


Para Paulo Freire (em Conscientização: teoria e prática da libertação): “a convocação do homem é a de ser sujeito e não objeto. Pela ausência de uma análise do meio cultural, corre-se o perigo de realizar uma educação pré-fabricada, portanto, inoperante, que não está adaptada ao homem concreto a que se destina.”  O projeto de uma educação antirracista, deve buscar a superação de qualquer lógica que não contribua para uma educação pautada na equidade de direitos de todos os sujeitos envolvidos, através de práticas transformadoras, que possibilitará a busca por ser Magis – termo, em latim, que quer dizer mais, maior ou melhor é algo que caracteriza a profunda experiência do amor de Deus, vivida por Santo Inácio de Loyola e transcrita por ele no livro dos Exercícios Espirituais.

Já Djamila Ribeiro, no Pequeno Manual Antirracista, ao falar sobre racismo, afirma: “Perceber-se é algo transformador. É o que permite situar nossos privilégios e nossas responsabilidades diante de injustiças contra grupos sociais vulneráveis”. Por isso, a possibilidade de executar atividades de formação de uma comunidade antirracista se faz urgente, pois contribui para que todos os componentes dessa comunidade, tenham a possibilidade de não invisibilizar as pessoas que ali trabalham ou estudam.  Portanto, um pressuposto básico, na contribuição para a transformação da educação e, portanto, da nossa sociedade, é de que precisamos mudar de atitude. Talvez, um primeiro passo pode ser se perguntando: o racismo habita em mim?


REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação. 3.ed. São Paulo: Centauro 2006.  PROJETO Educativo Comum (PEC). Rio de Janeiro: Loyola, 2016.RIBEIRO, Djamila. Pequeno manual antirracista. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

Utilizamos cookies para melhorar sua experiência em nossos sites e fornecer funcionalidade de redes sociais. Se desejar, você pode desabilitá-los nas configurações de seu navegador. Conheça nossa Política de Privacidade.

Concordo