O que esperar dos colaboradores em um mundo pós-pandemia? Confira a entrevista com Sérgio Silveira
Mestre em Gestão Educacional e especialista em Neurociências, o professor é diretor de Gestão de Pessoas do Vieira

Por conta do Dia do Trabalho, comemorado em 1º de maio, o Colégio Antônio Vieira publica uma entrevista especial com o mestre em Gestão Educacional e especialista em Neurociências e Comportamento, professor Sérgio Silveira, que é o diretor de Gestão de Pessoas da instituição. Os novos desafios e perfis exigidos dos profissionais e organizações no mundo do trabalho contemporâneo, principalmente após o contexto pandêmico, é um dos temas tratados. As diferenças entre ser multitarefas, “multitarefeiro” e multirrelacional, bem como a importância da inteligência emocional, também são abordadas na entrevista, além dos diferenciais de acolhimento e cuidado aos colaboradores do Vieira que são um diferencial da Rede Jesuíta. Confira agora!
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1- O que esperar dos profissionais em um mercado de trabalho pós-pandemia? Como isto se reflete no ambiente escolar?
Prof. Sérgio Silveira: O contexto pandêmico alterou profundamente o modo de ser e de pensar no trabalho. O que se esperava alcançar em termos de teletrabalho e de tecnologias, ou de novas formas de pensar o próprio trabalho para os próximos anos, a pandemia fez com que tudo isso pudesse ser antecipado, e isso afetou diretamente os profissionais. Então, a gente compreende que muitas pessoas estavam se preparando para entrar numa dinâmica mais autônoma, mas autogerenciável de seu tempo, de seu trabalho e, de repente, se viram imersas em uma necessidade premente de estar gerenciando seu tempo, em casa, no trabalho, sua própria auto-organização. Enfim, uma série de mudanças foram incorporadas ao profissional ao longo desse tempo de pandemia e, obviamente, após esse período. Com a retomada das atividades presenciais, muita coisa também precisaria, e ainda precisa, ser repensada em termos de atividades, comportamentos, pensamentos, até considerando que muito do psicológico das pessoas foi afetado pelo contexto pandêmico e isso influencia também na forma de se trabalhar, de se pensar, enquanto trabalhador, enquanto profissional. Dentro do ambiente escolar, isso não é diferente porque nós temos toda uma equipe de profissionais – seja docentes, seja não-docentes, toda a parte que trabalha com o backoffice, que também foi afetada diretamente pelo contexto pandêmico e, certamente, isso vai refletir no modo de se relacionar uns com os outros, entre seus pares, mas também no modo de se relacionar com os alunos, que também chegam com uma nova dinâmica a ser incorporada em função desse tempo de exceção. Então, a gente compreende que esse retorno ainda não se tornou completo, ainda está em processo, e esse processo inclui o repensar as relações, o repensar a aproximação, o rever as práticas, compreender como determinas situações, determinados conteúdos chegam nesses novos contextos a essas novas pessoas, considerando que nós já não somos mais as mesmas pessoas que éramos antes da pandemia porque tivemos que incorporar diversas práticas que não faziam parte do nosso cotidiano. É necessário, portanto, ainda rever tudo isso que nós vivemos e ressignificar, para que a gente possa pensar possiblidades, novas maneiras de atuar dentro desse novo contexto, com essas novas pessoas que integram a escola.
2- Neste contexto, as ações de formação para colaboradores das instituições jesuítas podem ser consideradas um diferencial?
Desde o início da pandemia, a Rede Jesuíta de Educação já vinha se reunindo com seus comitês, sobretudo, o Comitê de Gestão de Pessoas e o Comitê de Formação, para pensar ações conjuntas que pudessem ajudar os nossos colaboradores, em toda a Rede, a passarem por este tempo de uma forma que se sentissem cuidados. Uma das máximas da Espiritualidade Inaciana é justamente a Cura Personalis, que a gente compreende como o cuidado integral com o indivíduo que faz parte das nossas obras. Então, a gente, sim, considera que foi um diferencial tudo aquilo que foi possível pensar e realizar dentro das nossas unidades, desde a composição das cartilhas que distribuímos para as unidades educativas com orientações do que poderia ser feito, sobre como montar os protocolos de acesso às unidades, mas também de como cuidar de seus colaboradores. Então, nós inserimos naquele momento a necessidade do cuidado psicológico, do acompanhamento, do cuidado com as pessoas no seu trabalho em home office; além da cessão, por empréstimo, de equipamentos e mobiliário para que as pessoas pudessem ter a condição necessária para realizar o seu trabalho, dentro de todo um portifólio de ações de cuidado com os colaboradores. Aqui, no Colégio Antônio Vieira, por exemplo, além das orientações da Rede Jesuíta, nós tivemos nossas próprias ações e nosso próprio modo de lidar com as questões que foram surgindo ao longo desse tempo de pandemia. Fechamos, por exemplo, uma parceria com a Universidade Católica do Salvador, com o Setor de Psicologia, com o qual nós pudemos contar e oferecer aos colaboradores rodas de conversa, atendimento psicoterápico, além de encontros com psicólogos cedidos pela Universidade, para que a gente pudesse dar todo um suporte para os profissionais. Além disso, nós reforçamos, dentro de nossos encontros de formação, a necessidade do cuidado pessoal, do olhar para si, do cuidar das suas emoções, do cuidado nessa nova forma de se relacionar com o outro, em trabalhos focados para os colaboradores em geral, mas também junto aos nossos gestores, por meio do nosso Programa de Desenvolvimento de Gestores (PDG), em que tivemos diversas ações e encontros de formação que versaram sobre essa temática do cuidado com o outro e consigo mesmo. A premissa que nós partimos sempre foi de que “ninguém dá aquilo que não tem”. Ou seja: não era possível para o gestor falar de cuidado com o seu colaborador, se este também não se sentisse cuidado. Então, de modo geral, as ações que foram desenvolvidas nas instituições jesuítas, sim, foram um diferencial para os nossos colaboradores.
3- Para além desse contexto pandêmico, muitos pesquisadores acadêmicos afirmam que, para o mundo contemporâneo, não basta mais ser o profissional multitarefas, é preciso ser também multirrelações. O que isto significa na prática?
Falando das competências desse profissional dos novos tempos, de fato, durante muito tempo, sobretudo na área de Gestão de Pessoas e Recursos Humanos, falava-se da necessidade do profissional ser multitarefas e, aqui, vale destacar que tem uma diferença entre o profissional ser multitarefas e ser “multitarefeiro” – no caso, aquele que faz muitas coisas, mas no final tem uma entrega deficitária; aquele que se enche de atividades para fazer, mas que, não necessariamente, são atividades que impactam na busca por uma entrega mais qualificada. Muito pelo contrário: acaba sendo atropelado, engolido pelas demandas, pela falta de tempo por ter assumido muitas tarefas a serem feitas. Já o profissional multitarefas, diferentemente do “tarefeiro”, é aquele que compreende o limite das suas entregas e percebe que elas se esbarram com outras que podem potencializar a sua. Ou seja: não basta ficar focado apenas naquilo que eu sou capaz de fazer, como um limite determinado para aquilo para o qual eu fui contratado, mas estar de olho em todas as outras tarefas que podem agregar valor à minha. Com isso, o multitarefas é aquele que percebe no seu ambiente, na sua forma de fazer, como potencializar a sua entrega, a partir do olhar focado em outras tarefas que agregam valor à sua tarefa. Mas, de fato, esses novos tempos trouxeram uma outra vertente de características para além do multitarefas: é o profissional multirrelacional. Ou seja, a formação de redes, de conexões, tem sido o grande mote desses novos tempos e a pandemia exacerbou muito essa ideia, porque ela nos permitiu, por meio da tecnologia, ampliar os nossos horizontes, as nossas redes. A gente percebe, então, que o profissional que pôde surfar nessa onda, de ampliar o seu networking a partir da criação de novas redes, novas conexões, conseguiu também agregar mais valor ao seu trabalho, mais valor às suas ideias. Mas, o multirrelaçional é muito mais do que simplesmente ampliar, criar novos contatos; é preciso saber criar conexões produtivas e positivas para que possa fomentar, nas suas entregas, no seu trabalho, a capacidade de tornar mais qualitativo aquilo que já é muito bom. Ou seja: à proporção que eu vou me abrindo às novas experiências, eu tenho uma possibilidade exponencial de potencializar o meu trabalho, porque eu estou oxigenando mais, estou trazendo inovações, novas possibilidades com novos olhares e formas de realizar o que já vem sendo feito.
4- É preciso, então, estar pronto para assumir novas tarefas e formar relações, mas sempre com muito critério, equilíbrio. É isso?
Eu diria que, atrelada à multirrelação, vem algo muito importante que esse tempo também nos trouxe que é a capacidade de gerir as nossas emoções. Ou seja, a inteligência emocional volta a ser um grande aspecto considerado para esse profissional do século 21, sendo ela a capacidade que a gente tem de gerir, de fato, as nossas emoções, que normalmente surgem a partir das relações que nós travamos com as demais pessoas. Então, pessoas que são inteligentes emocionais são pessoas que vão olhar para as situações, sobretudo, as situações mais adversas e perceber nelas a capacidade, a oportunidade, de trilhar novos rumos. Assim, creio que a pandemia foi um grande teste para a nossa inteligência emocional, em que nos encontramos em uma situação tão diferente de tudo o que a gente já havia vivenciado em nossa existência para perceber, ainda assim, a possibilidade de ressignificar a nossa forma de ser, estar e pensar o mundo em que a gente está inserido. Fomos, de fato, bastante testados em nossa inteligência emocional e os profissionais que conseguiram compreender a importância dessa característica, com certeza hoje estão vivenciando uma condição de vida e de trabalho muito melhor e com uma vantagem competitiva diante de outros profissionais que não conseguiram atentar-se para essa questão.
5- Diante de tantas demandas de conhecimentos impostas pela velocidade da Era das Tecnologias Digitais, temos vistos notícias de profissionais no mercado que enfrentam questões de exaustão, como a Síndrome de Burnout. Como a Gestão de Pessoas do Vieira cuida da qualidade de vida de seus colaboradores, para além da oferta do plano de saúde?
Desde muito antes da pandemia, a nossa capacidade de produção já vinha sendo testada à exaustão para que nós pudéssemos permanecer e nos sentir ativos. A gente sabe que muitas empresas não conseguiram se manter de pé, mas grande parte das que conseguiram, o fizeram pela forma de reinventar a sua atuação. Mas, para que as empresas conseguissem reinventar a sua forma de atuação, foram as pessoas, foram os profissionais, que tiveram que passar por esse processo de reinvenção, de ressignificação, o que exigiu, de grande parte dos profissionais, um investimento muito maior em tempo, em cognição, em criatividade, em contato com redes, interações, em contato com a própria tecnologia para que a gente pudesse ganhar o tempo necessário para fazer as coisas permanecerem rodando como era preciso. Obviamente, que tudo isso demandou um esforço muito maior de todos nós, por estarmos vivendo esse tempo de pandemia, o que contribuiu, sobremaneira, para diversas patologias que acometeram e que acometem os profissionais de hoje, principalmente. Dentre elas, as questões psicológicas, como depressão, ansiedade e, mais especificamente, no mundo do trabalho, a Síndrome de Burnout, que é caracterizada por um agudamento do estresse causado, sobretudo, pelo excesso de trabalho. A gente começa a perceber que uma pessoa está com sinais de Burnout quando começa a perder o equilíbrio emocional dentro do ambiente de trabalho. Uma reação descabida ou desmedida diante de situações que, em outros momentos, seriam tranquilamente contornáveis; a falta de interesse, motivação, para estar em seu trabalho; muitas vezes, a própria forma de lidar com aquilo que faz, o desinteresse, o desdém, o cansaço excessivo, o estresse cada vez maior, a falta de paciência, e um conjunto de sinais que podem atingir, até de forma mais contundente, a saúde física das pessoas. Então, a gente tem uma situação que começa de uma forma emocional, psicológica e, de repente, torna-se uma doença psicossomática porque vai afetar também o corpo como um todo e, se isso não for visto pelas instituições, pelas empresas, haverá um quadro crescente de pessoas cada vez mais afetadas por síndromes como a de Burnout, entre questões psicológicas que têm afetado o mundo do trabalho contemporâneo…
6- É algo, então, que o Vieira parece estar muito atento diante da premissa do cuidado que é um marco nas instituições jesuítas, não é?
Sim, aqui no Colégio Antônio Vieira, o que nós buscamos priorizar é a qualidade de vida. Primeiramente, fazer com que os colaboradores compreendam que todo o trabalho precisa ser feito, sim, mas um trabalho que nos dê a possibilidade de viver a nossa condição de pessoa, com a nossa integridade física, psicológica e social preservada. Então, mesmo durante o tempo de pandemia, nós buscamos não exigir mais do que as pessoas poderiam dar, tentamos diversificar as nossas ações, promover de alguma forma encontros, mesmo que fossem virtuais, para que as pessoas pudessem falar de suas demandas; não deixamos de prestar as homenagens aos nossos professores, aos colaboradores, enfim, fomos buscando formas de fazer com que as pessoas compreendessem a sua importância para a nossa instituição. E, quando tivemos a oportunidade de retornar presencialmente, nós também o fizemos com muito cuidado para que as pessoas percebessem que muita coisa havia de ser feita, sim ainda, mas que as pessoas não precisariam ir se atropelando, sem se cuidar, sem se ver, sem se olhar. Então, eu diria que uma das formas que nós encontramos de cuidar dessas pessoas foi não só oferecer o acompanhamento psicológico, com as parcerias que nós fizemos, mas também, com cuidado, acolhendo essas pessoas que iam aos poucos retornando ao trabalho: com atenção, sem excesso de cobrança nas entregas que precisavam fazer, buscando criar situações e possibilidades em que a gente pudesse deixar as pessoas com mais liberdade e com a consciência de que, independentemente de estarem realizando o seu trabalho, ou remotamente ou presencialmente, aquilo estaria sendo visto com muito carinho, com muito cuidado. Então, diferentemente de outras instituições que lançaram mão, por exemplo, das medidas provisórias que autorizavam a redução do salário, a suspensão de contrato etc, nós compreendemos que era um momento em que as pessoas mais precisavam ter os seus direitos, os seus benefícios garantidos, e nós assim o fizemos, de forma a deixar compreender que, muito mais do que a entrega do processo em si, estava ali por trás um cuidado com a pessoa que realiza o processo. Essas, dentre outras, foram ações que pudemos trazer para os colaboradores da nossa instituição, assegurando um pouco mais de tranquilidade para que eles pudessem desacelerar um pouco, sobretudo, nesse tempo em que havia uma cobrança muito grande, em diversos aspectos, para produzir, para dar conta. Nós optamos, assim, por deixar com que as pessoas compreendessem que nós queríamos que os processos acontecessem, mas que, sobretudo, elas estivessem bem e com qualidade de vida.
7- Qual sua mensagem para o colaborador do Vieira por conta do Dia do Trabalho?
Comemorar o Dia do Trabalho é, sobretudo nos dias de hoje, comemorar um dia de vitória, porque estamos vivendo tempos bastante difíceis, principalmente com o índice de desemprego cada vez mais alarmante em nosso país, em nossa cidade, e, para nós que estamos hoje colocados no mercado de trabalho – com nossos direitos e benefícios reconhecidos, com um clima saudável, com pessoas que estão à frente dos nossos setores com a capacidade de olhar para este ser humano, que é o profissional da nossa instituição – , precisa realmente ser um dia de comemoração. Então, eu, como colaborador também dessa instituição, me sinto extremamente valorizado e gostaria que cada um e cada uma, profissional que atua no Colégio Antônio Vieira, pudesse perceber como ele, ela, é valorizado, valorizada, aqui nessa instituição. Uma instituição que nos abraça e que nos coloca sempre em condição de crescimento. Assim, desejo muito que cada profissional que aqui está possa reconhecer a importância que essa instituição tem na vida de cada um de nós e que, acima de tudo, a gente consiga compreender que o que mais prezamos é que as pessoas aqui tenham qualidade de vida. Então que, reconhecendo isto, a gente consiga cada vez mais entregar as nossas ações, as nossas tarefas, com todo amor, com todo afinco necessário para que possamos corresponder a esse cuidado que nós sentimos que temos aqui na nossa instituição. Desejo de coração, portanto, que seja um dia de comemoração para todos nós, de louvar e agradecer a Deus pelo trabalho que nós temos, pela instituição que nos abraça e a qual nós abraçamos também. E que, nos solidarizando com aquelas pessoas que, infelizmente, estão fora do mercado de trabalho, a gente possa valorizar cada vez mais aquilo que nós temos, mas, acima de tudo, que a gente possa também pedir a Deus por essas pessoas, para que possam ser recolocadas também no mercado de trabalho e, com isso, tenham condições de alcançar os seus sonhos e objetivos, como nós aqui estamos fazendo.
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